Presas por atos em 8 de janeiro reclamam de banho gelado e comida

PolíticaAtaques em Brasília

Presas por atos em 8 de janeiro reclamam de banho gelado e comida

Até o fim da tarde desta segunda, 27, 605 homens e 305 mulheres permaneciam presos

Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Mulheres que ficaram detidas no sistema penitenciário do Distrito Federal por participação nos atos golpistas de 8 de janeiro reclamam principalmente da qualidade da comida e de banho gelado quando relembram do período no presídio da Colmeia.

Segundo a Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, até o fim da tarde desta segunda-feira (27) 605 homens e 305 mulheres permaneciam presos pelos atos de 8 de janeiro. Nesta segunda e terça (28), o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou a soltura de 173.

A reportagem conversou com mulheres liberadas após o uso de tornozeleira eletrônica, defensores públicos e advogados de presos e presas.

Duas mulheres, de 49 e 58 anos, que estavam presas e foram soltas mediante monitoramento com tornozeleira eletrônica, falam em arrependimento de estar em Brasília em 8 de janeiro; mas dizem que não participaram das depredações às sedes dos três Poderes.

Uma delas afirmou que estar na prisão é como se a pessoa estivesse morta -não se sabe o que acontece do lado de fora e a família não consegue fazer contato.

Ela foi levada para a Colmeia dias depois das depredações. Ficou presa por cerca de dez dias, período que relembra chorando. Para ficar na cela, ganhou um kit de roupa branca contendo bermuda, camiseta, calcinha, escova de dente e um colchão.

Foi nesse colchão que passou a maioria do tempo, sentada e dividindo cela com mais 12 pessoas de diversos cantos do país. Elas compartilhavam uma pia e um vaso sanitário.

A mulher disse ter ficado os primeiros cinco dias sem trocar de roupa até a família comprar novos kits. Contou ainda que uma das presas estava menstruada e não tinha troca de roupa.

Ela afirma que o mais problemático na prisão era a comida.

Segundo seu relato, as presas eram servidas duas vezes ao dia. No almoço recebiam uma marmita e um suco. Nos primeiros dias não havia talheres e tinham que comer com a tampa do recipiente.

Ao anoitecer, diz que recebiam outra marmita com mais dois pães, uma fruta e uma caixinha de achocolatado -esses últimos itens eram para o café da manhã. A mulher afirma que diversas vezes a comida inteira, que classificou como lavagem, foi descartada no lixo.

Outra mulher presa e posteriormente liberada após colocar uma tornozeleira eletrônica também relembra chorando do seu período na Colmeia. Segundo ela, muitas pessoas passaram mal dentro do presídio devido à qualidade da comida.

A mulher afirma que o alimento vinha azedo em diversas ocasiões e que passou fome.

Conforme o defensor público Gustavo de Almeida Ribeiro, que esteve na Penitenciária Feminina do Distrito Federal nesta segunda, a principal reclamação das presas é em relação à comida, que consideram ruim. Elas também se queixam da falta de higiene.

O defensor, porém, afirmou não ter observado nenhuma questão que pudesse ser identificada como violação aos direitos humanos.

"A maior reclamação que ouvi foi que a comida. Às vezes parecia não estar limpa, com a presença de algum inseto; ou algum tipo de sujeira, como cabelo. Algumas presas estavam tranquilas, outras mais inconformadas", disse.

Uma das mulheres entrevistadas conta que agora precisa se apresentar semanalmente à Vara de Execuções Criminais do fórum da cidade em que vive e que não pode usar mais redes sociais por determinação judicial.

Ela diz ter permanecido no acampamento em frente ao quartel-general do Exército, que as pessoas se arrependeram de ter ido e que só ao sair da prisão teve a dimensão dos danos causados pelos ataques.

Uma das entrevistadas, que é evangélica, afirma ter passado os dias na cela orando. Ao sair da prisão, ela diz ter parado de ir aos cultos por causa da tornozeleira eletrônica.

Ela afirma que se arrepende de ter participado dos atos e que na prisão há sensação de morte.

Uma das maiores preocupações da defensoria foi com a prisão de um homem de 28 anos com diagnóstico de esquizofrenia e retardo mental moderado. Ele era acompanhado pela Rede Municipal de Atenção em Saúde Mental de Feira de Santana, na Bahia.

Desde o dia 30 de janeiro, a Defensoria Pública da União pedia a sua liberdade provisória, baseada em laudos médicos.

O subprocurador-geral da República, Carlos Frederico Santos, também solicitou que a sua prisão fosse substituída por medidas cautelares.

O pedido foi feito com outras 153 pessoas, que, segundo informações recolhidas por autoridades, estavam nos arredores do quartel-general do Exército e não entraram ou vandalizaram os órgãos públicos, e só foi atendido pelo ministro Alexandre de Moraes nesta segunda.

OUTRO LADO

De acordo com a assessoria de imprensa da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, o grupo continua preso em blocos e alas separadas dos detentos comuns e a rotina é a mesma para todos: duas horas de banho de sol por dia, quatro refeições diárias, além de direito a atendimento médico, jurídico, odontológico e psicológico.

O órgão também afirma que "os presos seguem aguardando um posicionamento jurídico do ministro Alexandre de Moraes".

A secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal afirma, em nota, que não há distinção entre custodiados do sistema prisional.

Ainda segundo a secretaria, em unidades prisionais não há água quente para banho. Trata-se de protocolo de segurança, tendo em vista que a fiação elétrica pode ser mal utilizada pelas pessoas privadas de liberdade.

O órgão afirma ainda que não houve ausência de absorvente na prisão e cada custodiada recebeu dois pacotes contendo oito absorventes cada.

Sobre a alimentação, informou que os contratos são objeto de extrema diligência por parte dos gestores da pasta, tendo por objetivo o fornecimento de comida de boa qualidade.

DESDOBRAMENTOS NA JUSTIÇA DOS ATAQUES GOLPISTAS:

Reação

Desde os atos golpistas na praça dos Três Poderes, em Brasília, uma sequência de prisões e operações de segurança foi realizada mirando não somente os executores, mas os fiadores e instigadores dos atos de vandalismo nos prédios do STF (Supremo Tribunal Federal), do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto.

Investigação

A Polícia Federal deflagrou a Operação-Lesa Pátria, com seis fases, tendo como alvos participantes a autores intelectuais dos ataques. Enquanto isso, a PGR (Procuradoria-Geral da República) criou grupos especiais para averiguar e buscar reparação pelos danos causados, e a AGU (Advocacia-Geral da União) pediu bloqueio de R$ 20,7 milhões de 134 pessoas, 5 empresas e 2 entidades suspeitas de envolvimento e patrocínio.

Responsabilização

Os manifestantes golpistas que invadiram a Esplanada dos Ministérios podem responder por crime contra o Estado democrático de Direito. Se identificada omissão, autoridades também poderão ser responsabilizadas, avaliam especialistas ouvidos pela Folha.

Prisão preventiva

A maioria dos encarcerados está neste regime de prisão, quando há a privação de liberdade em medida cautelar para evitar o cometimento de novos crimes, como a fuga de suspeitos, ou a eliminação de provas a serem coletadas no processo. A prisão, neste caso, não é definitiva, e depende de julgamento do delito.

Pedidos em aberto

Ao denunciar os envolvidos e em outras manifestações relacionadas aos atos antidemocráticos, a Procuradoria defendeu que acusados respondam às acusações em liberdade, mas não há ainda decisão do ministro Alexandre de Moraes. O magistrado concedeu o benefício em casos pontuais até o momento 

 

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Segunda, 23 Dezembro 2024

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