Especialista aponta os sinais e como escapar de uma relação abusiva

Especialista aponta os sinais e como escapar de uma relação abusiva

No último domingo, delegada que vivia relacionamento tóxico foi vítima de feminicídio 

No último domingo (11), a Bahia foi surpreendida com a notícia de que uma delegada foi encontrada morta dentro do próprio veículo, em uma área de mata, próximo à BR-324, em São Sebastião do Passé.

A vítima era Patrícia Neves Jackes Aires, assassinada pelo namorado, que horas depois foi preso em flagrante e, em depoimento, confessou ter praticado o crime usando um cinto de segurança no pescoço da companheira, que atuava em Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo Baiano.

Familiares e amigos de Patrícia declararam em entrevistas que a delegada vivia uma relação conturbada, marcada por idas e vindas, e era vítima de agressões. Ainda que vivenciando um relacionamento abusivo, a delegada era conhecida por sua atuação em defesa das mulheres vítimas de violência doméstica. 

Vulnerabilidade emocional

De acordo com a psicóloga Débora Oliveira, que atua em Feira de Santana e cuja tese de mestrado está relacionada à violência contra as mulheres, muitos estudos apontam que a dependência financeira e a falta de recursos podem ser sim grandes responsáveis para se manter as mulheres em situação de violência doméstica. No entanto, é comum observar cada vez mais mulheres consideradas 'bem-sucedidas' e ocupando espaços de poder inseridas em um contexto violento e disfuncional.

"O processo é mais complexo do que podemos imaginar. Primeiro temos de lembrar que geralmente os relacionamentos não começam de maneira violenta e, muitas vezes, se torna difícil perceber as mudanças ocorridas, principalmente quando a violência física ainda não está explícita. Outro fator determinante são as crenças limitantes, sentimentos de inferioridade e insegurança pessoal. A mulher envolvida passa a ter uma percepção distorcida da relação e do sujeito. Devemos ressaltar que o abusador envolve a vítima e impõe a ela sua maneira de pensar, minimizando a violência; deprecia a mulher, restringe sua liberdade e a faz desacreditar de si mesma", ressaltou a profissional.

Foto: Arquivo Pessoal | Psicóloga Débora Oliveira destaca sinais de abuso em relacionamentos

Identificando os sinais

Como identificar os sinais de que se está vivendo um relacionamento tóxico? Em primeiro lugar, segundo a psicóloga Débora Oliveira, a mulher precisa saber e sentir que não está sozinha e, posteriormente, buscar ajuda.

Ela destacou que, atualmente, o debate sobre a violência contra mulher está mais acessível e as discussões ocorrem abertamente em determinados espaços e pelas redes sociais. "Alguns sinais são mais visíveis que outros. Tendemos a romantizar muitos sinais no início do relacionamento. Muitas vezes confundimos controle e excessos com amor. Costumo orientar as mulheres que acompanho para estarem alertas para algumas sirenes:

- Se ele tem temperamento explosivo, existe aí um potencial para violência futura;

- Pessoas que não têm controle sobre suas emoções e reagem de maneira violenta em situações profissionais ou do seu cotidiano tendem a reagir da mesma forma nos relacionamentos quando se sentem confortáveis para tal;

- Se seu parceiro ou companheiro verifica seu celular ou e-mail sem sua permissão, isso também deve ser observado;

- Se ele deprecia você ou te afasta de familiares e amigos;

- Os ciúmes e a insegurança excessiva também te colocam no lugar de risco;

- Tenta controlar suas ações e determinar o que você deve fazer;

- Faz falsas acusações e te faz sentir culpa a todo momento, faz você pensar que está louca.

"Esses são apenas alguns sinais de que você pode estar entrando numa relação abusiva, mas cada caso deve ser percebido na sua individualidade, o ideal é que essa mulher busque ajuda", enfatizou Oliveira

Tipos de abusos

Conforme a psicóloga, que é especialista em Saúde Mental, Psicopatologia e Atenção Psicossocial, a Lei Maria da Penha tipifica diferentes tipos de violência:

Violência Física: quando há uso da força, como empurrões, puxões, imobilização, ferimentos, entre outras formas de agressão física;

Violência Psicológica: quando há opressão psicológica, feita por meio das ameaças, intimidação e humilhações;

Violência Moral: neste caso, a mulher sofre por calúnias, difamações e muitas vezes é chantageada pelo companheiro;

Violência Sexual: a mulher pode ser violada sexualmente por aquele que "deveria" lhe trazer proteção e cuidado. São feitas imposições sexuais sem seu consentimento (abuso, assédio, estupro).

"A violência sexual, muitas vezes, passa despercebida, porque a vítima entende que, estando em um relacionamento amoroso, é sua obrigação dar prazer ao companheiro ou namorado, e se sente ameaçada em perder essa relação, se não corresponder às expectativas desse sujeito, então acaba cedendo às suas imposições sexuais", revelou.

Violência Econômica ou Patrimonial: quando seus bens são subtraídos e passam a ser de controle exclusivo do abusador.

"Muitas mulheres que trabalham chegam à clínica sem fazer uso do seu próprio dinheiro ou sem saber qual é o patrimônio familiar. Para além dessas citadas na Lei, existem outras. É importante ressaltar que a violência psicológica geralmente está acompanha a todas as demais violências e abusos, considerando que danos emocionais são gerados e trazem prejuízos à saúde."

Afirmações abusivas

"Ela me obrigou a isso!", "Eu só queria me defender!", "Se ela tivesse me obedecido, nada disso teria acontecido", "Ela me provocou, não sou uma pessoa ruim!", estão entre as falas comumente utilizadas por abusadores.

"Durante minha permanência enquanto estudante no Mestrado em Planejamento Territorial na Universidade Estadual de Feira de Santana, estudei o comportamento dos agressores por meio da Vara de Violência Doméstica do município e pude perceber algo bem interessante: grande parte dos homens intimados pela Vara de Violência não compreendia sua ação como um ato de violência e descreviam seu comportamento como uma resposta a uma situação vivida com sua parceira. (…) Os agressores recorreram a discursos que culpabilizavam as mulheres pela experiência de violência ou minimizavam a natureza dos episódios", refletiu Débora Oliveira.

O gaslighting

Termo ainda desconhecido por muitas mulheres, o gaslighting é uma forma de manipulação emocional e psicológica em que o indivíduo procura convencer o outro de algo que não aconteceu, distorcendo a sua percepção da realidade.

"É considerada como uma tática de manipulação onde o sujeito que a pratica obtém benefício próprio e convence a vítima a duvidar das suas próprias convicções e percepções e até mesmo a questionar sua memória e sanidade mental. O manipulador utiliza frases como: "Você está louca", ou "Você não percebeu o que fez", "Não foi assim que aconteceu", para convencer a vítima de que ela está errada. Nesses casos a vítima está extremamente envolvida com o agressor e só percebe que está sendo vítima quando já se passaram muitas situações e seu sofrimento se torna intenso", esclareceu

Rota de fuga

O primeiro passo é admitir que está em um relacionamento abusivo, reiterou a psicóloga. Depois, prossegue, é importante oferecer a essas mulheres orientações e estratégias eficazes para que elas consigam sair do relacionamento e reconstruir sua vida com segurança.

"A mulher deve buscar ajuda profissional adequada, que vá oferecer um ambiente seguro. Para além dessas pessoas, sua rede de apoio deve ser presente e atuante e neste campo contamos com amigos e familiares. Em casos em que exista o risco de morte por parte da vítima, é imprescindível traçar rotas de fuga seguras, apoio permanente da polícia, estabelecimento de medida protetiva, guardar documentos importantes e sempre estar acompanhada." 

 

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Quarta, 27 Novembro 2024

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