ONU aprova declaração por paz na Ucrânia com apoio da Rússia, mas sem falar em 'guerra'
Trata-se do primeiro consenso do tipo.
Desvencilhando-se de um veto da Rússia, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou nesta sexta (6), de forma unânime, uma declaração que expressa "profunda preocupação" e "forte apoio" aos esforços diplomáticos por uma saída pacífica para a Guerra da Ucrânia. Trata-se do primeiro consenso do tipo.
A provável alternativa encontrada para que uma barreira não fosse imposta pela diplomacia russa está nas entrelinhas do sucinto texto redigido por México e Noruega, membros rotativos do colegiado: não há menção aos termos "guerra", "conflito" ou "invasão" –o governo de Vladimir Putin chama a guerra de "operação militar especial".
"O Conselho de Segurança expressa profunda preocupação com a manutenção da paz e a segurança na Ucrânia e lembra que todos os Estados-membros assumiram, sob a Carta da ONU, a obrigação de resolver suas disputas internacionais por meios pacíficos", diz a declaração, lida pela embaixadora dos EUA Linda Thomas-Greenfield.
As poucas frases não diferem muito do que o secretário-geral da ONU, o português António Guterres, tem dito em seus discursos e conversas com lideranças dos dois lados do conflito, mas simboliza o primeiro consenso do Conselho de Segurança, do qual a Rússia é membro permanente e já agiu para vetar resoluções que a prejudicariam.
"Pela primeira vez, o conselho falou em uma só voz pela paz na Ucrânia", disse o secretário-geral. "Saúdo este apoio e continuarei a não poupar esforços para salvar vidas e encontrar o caminho da paz."
"Acho encorajador ver que a diplomacia está conquistando seu lugar no conselho, embora este seja o primeiro passo inicial", afirmou o embaixador do México Juan Ramón de la Fuente a repórteres.
No front da guerra, neste sábado (7), 73º dia da invasão, forças russas alegam ter explodido três pontes rodoviárias na região de Kharkiv para retardar a contra-ofensiva ucraniana e ter destruído um grande estoque de equipamentos militares dos EUA e de nações da Europa também nos arredores –informações que não puderam ser confirmadas de maneira independente. Em Odessa, o governador regional disse que vários mísseis atingiram a cidade portuária.
Ataques voltaram a ser relatados por autoridades da Transdnístria, o enclave disputado por separatistas pró-Rússia na Moldova. O ministério do Interior afirma que, na noite de sexta, quatro explosões atingiram Voronkovo, a 5 km da fronteira com a Ucrânia, com artefatos lançados por um drone, e que não houve vítimas.
Já na portuária Mariupol, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha afirmou que segue com os esforços para retirar dezenas de civis que permanecem abrigados na usina de Azovstal. Ao jornal suíço Neue Zuercher Zeitung, o diretor de operações da organização, Dominik Stillhart, descreveu como "extremamente frustrante" as tentativas malsucedidas de um cessar-fogo que permitisse a operação.
"Em conversas com as partes em conflito, expressamos nossa preocupação com esse tipo de guerra. Infelizmente, não vejo razão para esperar que esse conflito termine em breve", acrescentou.
Oficiais da autodeclarada república de Donetsk, na região do Donbass, ao leste ucraniano, afirmaram que 50 pessoas foram tiradas de Azovstal e levadas para a vila de Bezimenne, área a cerca de 30 km de Mariupol também controlada por separatistas russos.
O ministério da Defesa do Reino Unido, que monitora o conflito, disse que a guerra está "afetando consideravelmente" algumas das principais unidades russas, afirmando que ao menos um T-90M, o tanque mais avançado da defesa russa, foi destruído em combate.
"Será particularmente desafiador substituir equipamentos modernos e avançados devido às sanções que restringem o acesso da Rússia a componentes microeletrônicos críticos", seguiu a defesa britânica.
Até aqui, a guerra no Leste Europeu deixou ao menos 3.309 civis mortos, de acordo com balanço atualizado do braço de direitos humanos das Nações Unidas –que reconhece a subnotificação da cifra. Cerca de 234 vítimas são crianças, e pelo menos 3.493 civis também ficaram feridos.
Com a crise migratória como uma das principais consequências do conflito, a Ucrânia já assistiu a mais de 5,8 milhões de cidadãos deixarem o país, tendo as vizinhas Polônia e Romênia como principais destinos, mostram dados do Acnur (Agência da ONU para Refugiados).
Ainda que em menor escala, a guerra também parece ter gerado um movimento de diáspora dos russos. De acordo com o jornal Moscow Times, dados do FSB (Serviço Federal de Segurança) mostram que 3,8 milhões de russos viajaram de janeiro a março deste ano –não fica claro quantos já retornaram para a Rússia.
A Geórgia, por exemplo, recebeu 38 mil russos no primeiro trimestre deste ano, aumento de quase cinco vezes em relação aos 8.500 aceitos no mesmo período do ano passado. O afrouxamento das restrições relativas à pandemia de Covid-19 influencia na cifra, mas analistas locais também veem como motivador o descontentamento de parte da população com as ações do governo de Vladimir Putin.
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