Professor da UFBA revela perspectivas sobre poder dos discursos na sociedade
É inegável a importância dos discursos
Ao longo da história, o poder deixou de se materializar apenas na força bruta e passou a se exercer por meio dos discursos. Pierre Bourdieu chamou de simbólico o poder de atuar mediante enunciados. Não por acaso, instituições e governantes, Estados totalitários e Estados democráticos, descendentes da casa-grande e líderes de movimentos sociais, todos eles buscam veicular determinados discursos e resistir a outros. Afinal, por meio do poder simbólico, do controle da disseminação (e da censura) do que se diz, constitui-se a realidade social, combatendo-se ou reforçando-se desigualdades e preconceitos.
É inegável a importância dos discursos, razão pela qual eles devem ser objeto de estudo não apenas na universidade, mas também na sala de aula da educação básica. Afinal, reflexões e discussões acerca dos discursos que circulam em nossa sociedade podem contribuir para a formação cidadã — e, por isso, crítica — de nossas alunas e alunos.
Diante da importância social e política dos discursos, as humanidades não poderiam deixar de investigá-los. Por isso, surgiram diferentes vertentes de análise do discurso, atraindo a atenção de diversas áreas de conhecimento: letras, sociologia, ciências políticas, filosofia e direito.
E uma dessas vertentes é a análise crítica do discurso, ou simplesmente, ACD. Inaugurada no final da década de 1980 por Norman Fairclough, seu principal proponente, e consolidada por ele e por Teun Van Dijk, Ruth Wodak, Michael Meyer, Gunther Kress e Theo Van Leeuwen, entre outros teóricos, a ACD é movida pela luta contra as desigualdades e os preconceitos. Com essa agenda emancipadora, mais do que necessária em tempos de tanta violência simbólica e de desigualdades variadas, a ACD se apresenta como uma área de conhecimento fundamental, não apenas para estudar os discursos circulantes em nossa sociedade, mas também para a prática pedagógica de quem se preocupa com a formação crítica de nossos estudantes.
Assim, em 2009, Luciano Amaral Oliveira passou a trilhar os caminhos da ACD, interessado em sacudir a ideia da (suposta) neutralidade na produção de conhecimento. Entretanto, começou a sentir certo incômodo em relação à ACD, o que foi bom, pois só podemos pensar criticamente e aprender quando chegamos a um lugar incômodo.
Nesse trajeto, o que o incomodava muito era o conceito de discurso. Logo ele, tão basilar para a ACD. Ele se perguntava o que é discurso, pois as definições propostas por Fairclough e Van Dijk não o convenciam pela falta de clareza.
Movido por esses incômodos, o autor se debruçou sobre a ACD e passou a lhe lançar um olhar crítico, analisando diversos textos de seus proponentes e de seus críticos. Resultado disso é essa Crítica à análise crítica do discurso, cuja leitura recomendamos não apenas a quem se interessa por essa área de conhecimento, mas também a quem se interessa por análise de discurso em geral.
Aqui se discutem questões importantes para quem transita na área das humanidades, a começar da necessidade de definir operacionalmente, de maneira clara e precisa, os conceitos teóricos mobilizados para a realização de pesquisas. Conceitos não claramente definidos perdem muito da sua validade teórica. E o conceito de discurso corre esse risco por conta das frágeis definições propostas pelos principais proponentes da ACD. Por isso, após problematizar esse ponto, o autor sugere a adoção da definição de discurso proposta por Michel Foucault, muito útil para os estudos do discurso em qualquer área de conhecimento.
Outra razão para ler esse livro é a oportunidade de participar da discussão de questões metodológicas postas pela forma de fazer análise crítica do discurso: crítica. Aqui se discute o que o termo crítica implica para a ACD, pelo exame das dificuldades que sua agenda emancipadora apresenta aos pesquisadores, mais especificamente as dificuldades para o atingimento de objetivos louváveis como a diminuição ou a extinção das desigualdades.
Além disso, os leitores encontrarão aqui uma discussão inadiável sobre o papel que o contexto, a etnografia e a interdisciplinaridade podem desempenhar na análise de discursos, mais especificamente na ACD. Esses três conceitos atravessam todos os campos de conhecimento da área de humanidades.
Por essas razões, Crítica à análise crítica do discurso é leitura urgente não apenas para quem analisa discursos, mas também para quem labuta com o ensino da leitura. A obra já está disponível nas principais livrarias e plataformas online.
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