SUS faz mais de 90% dos transplantes realizados em todo Brasil
Sistema é encarregado de gerenciar toda a captação de órgãos e a lista de pessoas que esperam
A surpresa de parte da população diante da entrada do apresentador Fausto Silva na fila de transplantes do SUS evidenciou como muitos desconhecem o funcionamento do nosso Sistema Único de Saúde. Além de gerenciar toda a captação de órgãos e a lista de pessoas que esperam por um coração, rim, fígado, pulmão, córnea ou medula, o SUS é responsável pelo financiamento de pelo menos 92% dos transplantes realizados em todo o País.
"O Brasil hoje tem o maior sistema público de transplante do mundo. Todo o sistema é financiado através do SUS, desde a avaliação pré-transplante até o transplante, e o acompanhamento pós transplante com as medicações que são necessárias para os pacientes para evitar rejeição. Além de ser uma referência no mundo nos critérios e distribuição dos órgãos doados", explica o coordenador do Sistema Estadual de Transplante, Eraldo Moura.
Os hospitais particulares credenciados para a realização de transplantes são acompanhados continuamente pelo SUS e precisam seguir os mesmos critérios válidos para a rede pública, afirma Moura. O objetivo é que todos transplantados tenham acesso ao mesmo padrão de atendimento quanto aos cuidados de saúde. "Nas unidades que são privadas, a diferença é a hotelaria, a parte de leito. Fora isso não tem nada diferente", enfatiza.
A depender do tipo de órgão que a pessoa inscrita no Sistema Nacional de Transplantes precisa, o tempo de espera não será o parâmetro central para a sequência. "O critério geralmente é o risco desses pacientes falecerem", esclarece o médico. A exceção é a destinação das córneas doadas, que ocorre como uma fila mesmo, seguindo a ordem de chegada na lista de pacientes.
Até junho deste ano, a Bahia tinha 1.554 pacientes aguardando rins, 1.216 esperando córneas, 26 precisando de um transplante de fígado e ninguém à espera de um coração, conforme dados da Secretaria da Saúde do Estado (Sesab). O coordenador ressalta que o Hospital Ana Nery está fazendo acompanhamento prévio e posterior aos transplantes de coração, dentro do processo de reimplantação do procedimento na Bahia.
Após a conclusão da retomada do programa de transplante de coração, prevista para o próximo ano, a meta é começar o processo para voltar a fazer transplantes de pulmão no estado. No caso desses dois órgãos, além da compatibilidade de grupo sanguíneo é preciso haver certa similaridade na estrutura física do doador e do receptor, já no caso de rins e de medula é necessário haver compatibilidade entre os sistemas imunológicos.
Segundo consta no Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), o Brasil tem atualmente 650 pessoas aguardando doadores não aparentados e mais de 5,6 milhões de cadastrados. O Redome mostra uma queda progressiva na realização de novos cadastros a partir de 2020, um possível impacto da Covid-19. O ano de início da pandemia teve 229 mil cadastros novos, 2022 teve pouco menos da metade disso, e este ano apenas 59,5 mil pessoas se cadastraram.
Na Bahia, transplantes de medula são realizados no Hospital Universitário Professor Edgar Santos (Hupes-Ufba/Ebserh), no hospital infantil Martagão Gesteira e no São Rafael, atendendo pacientes da rede privada. Moura conta que o procedimento está em implantação nos hospitais Roberto Santos e Santa Izabel, e também no Hospital Regional de Juazeiro. No ano passado, 138 transplantes foram feitos no estado.
Responsável pelo serviço de transplante de medula do Hupes, Alessandro Almeida conta que existem dois tipos de transplante de medula: autólogo e alogênico. No primeiro caso, o próprio paciente é seu doador e no segundo é utilizada a medula óssea de uma outra pessoa. "Cada transplante tem suas indicações específicas na dependência da doença que o paciente possui", fala.
Compatibilidade
No alogênico é preciso encontrar um doador compatível com o receptor, o que é mais simples entre parentes, principalmente irmãos com mesmo pai e mãe, entre os quais a chance de compatibilidade total é de 25%, explica Almeida.
"Embora haja preferência ainda para a utilização de doadores totalmente compatíveis, já é possível, com a evolução das técnicas do procedimento, realizá-lo quando apenas metade dos antígenos de compatibilidade dos doadores da mesma família são iguais", ressalta.
Quando não há doador viável na família do paciente, resta a busca entre os cadastrados no Redome. Na avaliação do médico, a quantidade de doadores voluntários ainda está abaixo do necessário. O cadastro pode ser feito por pessoas entre 18 e 35 anos, que respondem sobre suas condições gerais de saúde e depois terão a coleta de uma amostra de 10ml de sangue para a realização dos testes de compatibilidade.
"Há muitos mitos sobre a doação de medula óssea que precisam ser esclarecidos, tendo em vista que é um ato que pode auxiliar a salvar a vida de alguém com uma doença grave. A medula óssea retirada não faz falta para o doador e os riscos para a doação são mínimos", argumenta Almeida.
Ele destaca ainda a importância das pessoas cadastradas manterem seus dados atualizados no Redome.
Adesão familiar à doação na Bahia supera 60% desde 2018
A adesão familiar à doação de órgãos na Bahia não foi significativamente impactada pela pandemia de Covid-19, se mantendo superior a 60% desde 2018, de acordo com as estatísticas da Secretaria da Saúde do Estado (Sesab). Segundo a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, no ano passado, a negativa familiar chegou a 47% no País, já o nosso estado registrou 37,8% de recusa.
O coordenador do Sistema Estadual de Transplante, Eraldo Moura, conta que o número de doações tem aumentado nos últimos anos no estado e ressalta: "quanto mais doações, mais transplantes". Vale lembrar que a lista de espera é nacional, portanto doadores e receptores de todo o País são agrupados nele.
Entre os fatores envolvidos no bom desempenho baiano, Moura elenca a realização de campanhas, o trabalho continuo de capacitação dos médicos para o diagnóstico de morte encefálica e dos profissionais das comissões intrahospitalares para o acolhimento familiar.
Motivos de recusa
"Muitas vezes a pessoa não autoriza porque não conhece o processo de doação, não entende como funciona, não conhece a seriedade do processo, o compromisso com a sociedade de ter essa possibilidade de ajudar outras pessoas. E tem uma reflexão aí, o entendimento de que é todas as pessoas têm chance de, a qualquer momento, precisar de um transplante", ressalta o médico.
Os dados da Sesab apontam que a recusa em aguardar o processo de retirada dos órgãos foi a motivação de 23% das famílias que não aceitaram doar, seguida do desejo de manter o corpo íntegro (19%), da manifestação contrária da pessoa em vida (17%) e da falta de consenso entre os familiares (16%).
No ano passado, 797 mortes encefálicas foram notificadas e 125 resultaram na doação de múltiplos órgãos. No caso das córneas, a doação também é possível até seis horas após morte por parada cardíaca, o que explica a efetivação de 522 captações em 2022.
Fatores como contraindicação médica, adequação de faixa etária, ausência de familiares e não conclusão do protocolo são outros impeditivos para a doação.
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