Receita exonera secretário do caso das joias de Jair Bolsonaro após decisão da Justiça
Julio Cesar Vieira Gomes é investigado sob suspeita de pressionar funcionários
Após decisão da Justiça de Brasília, a Receita Federal publicou nesta quarta-feira (14) no Diário Oficial da União a exoneração a pedido do ex-secretário especial do órgão Julio Cesar Vieira Gomes, que é investigado sob suspeita de pressionar funcionários do aeroporto de Guarulhos (SP) para liberar as joias sauditas destinadas à família Bolsonaro.
O ato desta quarta é assinado pelo secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, e na prática torna sem efeito a suspensão da exoneração que ele próprio havia definido em abril.
Julio Cesar havia pedido e conseguido exoneração da Superintendência da Receita no Rio, mas o ato foi suspenso logo em seguida por portaria assinada por Barreirinhas.
Como mostrou a Folha na época, a decisão de Barreirinhas usava uma justificativa que não tinha amparo legal.
A portaria assinada por Barreirinhas barrava a exoneração considerando, "por cautela, a supremacia do interesse público, as peculiaridades do caso, o disposto no art. 172 da Lei nº 8.112/90" e uma investigação preliminar em curso na CGU (Controladoria-Geral da União).
O único dispositivo legal específico citado, o artigo 172 da Lei dos Servidores Civis da União (8.112/90), estabelece que o servidor "que responder a processo disciplinar" não pode ser exonerado a pedido com o procedimento em curso.
Ocorre que Vieira Gomes ainda não responde a processo disciplinar.
No caso das joias sauditas, ele era objeto de uma IPS (Investigação Preliminar Sumária) na CGU, que, como o nome diz, é uma apuração inicial em que não há ampla defesa e cujo objetivo é definir se há indícios mínimos de cometimento de delito e de autoria para posterior instauração do processo disciplinar.
Após ver seu pedido de exoneração suspenso, Viera Gomes recorreu à Justiça do Distrito Federal e obteve uma liminar favorável no último dia 5.
"Se a lei estabelece como restrição a existência de processo administrativo disciplinar, não pode a autoridade pública –qualquer que seja– ampliar o alcance normativo de uma norma para, elastecendo o comando normativo, atingir situações não previstas na lei", escreveu em sua decisão o juiz Leonardo Tocchetto Pauperio, da 16ª Vara Federal do DF.
O magistrado afirmou ainda que a Receita não deu a Vieira Gomes o direito de se manifestar ao suspender seu pedido de exoneração e ressaltou não haver obstáculo para abertura de PAD e aplicação da pena de demissão -nesse caso a sua situação mudaria de exonerado a pedido para demitido.
Vieira Gomes disse à Folha que "a justiça federal decidiu que a anulação da exoneração não tinha respaldo legal" e que a nova portaria acata a decisão para corrigir a ilegalidade.
A Receita não se manifestou até a publicação deste texto. A exoneração é retroativa a 25 de maio.
Vieira Gomes é suspeito de ter pressionado fiscais para liberarem as joias apreendidas no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Ele e Bolsonaro chegaram a conversar por telefone no final do ano passado sobre os itens de luxo apreendidos.
Em manifestações anteriores, o ex-secretário sempre negou a tentativa de interferência, dizendo ter seguido todas as orientações legais.
Integrantes da Receita e de outros órgãos que acompanham o caso afirmam, em caráter reservado, que uma possível intenção do ex-secretário ao pedir a exoneração seria a liberação para a livre atuação na área privada, como advogado.
De acordo com seu currículo, Vieira Gomes é doutor e mestre em direito tributário pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
O ex-corregedor da Receita Federal João José Tafner também afirmou ter sofrido pressão na gestão de Vieira Gomes para concluir e amenizar eventual punição contra o ex-chefe de inteligência do órgão, Ricardo Feitosa.
Como revelou a Folha, Feitosa acessou e copiou em julho de 2019 dados fiscais sigilosos do coordenador das investigações sobre o suposto esquema das "rachadinhas"(o então procurador-geral de Justiça do Rio Eduardo Gussem) e dois políticos que haviam rompido com a família presidencial, o empresário Paulo Marinho e o ex-ministro Gustavo Bebianno.
Vieira Gomes nega ter feito pressão sobre Tafner para amenizar eventual punição.
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