Arquivos indicam elo de fake news eleitoral de argentino com PL e Jair Bolsonaro

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Arquivos indicam elo de fake news eleitoral de argentino com PL e Jair Bolsonaro

Fernando Cerimedo tem feito lives e publicações para dizer que eleições brasileiras teriam sido fraudadas

Crédito: Reprodução/YouTube

Arquivos divulgados por um consultor argentino que tem insuflado a militância bolsonarista com falsas alegações de fraude eleitoral indicam elo entre ele e pessoas ligadas ao PL e ao governo Jair Bolsonaro (PL).

Desde o início de novembro, após a vitória de Lula no segundo das eleições, Fernando Cerimedo tem feito lives e publicações para dizer que as eleições brasileiras teriam sido fraudadas. Grande parte do que foi aventado por ele já foi desmentido por especialistas que analisaram os dados.

Após fazer uma nova live sobre as urnas eletrônicas no domingo (11), o consultor argentino divulgou um link para uma pasta com o que chamou de "dados para auditoria".

Informações dos arquivos indicam elo entre o argentino e a Gaio.io, empresa que colaborou com a equipe de auditoria do partido de Jair Bolsonaro, o PL. Além disso, um dos arquivos tem como proprietário Angelo Denicoli, militar da reserva que integrou o atual governo, na pasta da Saúde, e hoje é assessor da Presidência da Petrobras.

A presença de arquivos em nome de Balbino e Denicoli foi primeiro identificada pelo cientista de dados Marcelo Oliveira.

Procurados pela reportagem, o PL, Balbino e Denicoli não se pronunciaram. A reportagem enviou prints dos arquivos para ambos.

A pasta compartilhada por Cerimedo, neste domingo, em seu Google Drive tinha sete arquivos, sendo cinco deles de sua propriedade.

Além de dois arquivos não serem de Cerimedo, três deles tinham sido editados pela última vez por Eder Balbino, que é sócio da Gaio.io. A empresa é citada nove vezes no relatório técnico capitaneado pelo Instituto Voto Legal (IVL) e que baseou o pedido de anulação dos votos das urnas antigas feito pelo partido de Bolsonaro ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O presidente da corte eleitoral, Alexandre de Moraes, rejeitou a ação do PL por litigância de má-fé (exercício de maneira abusiva do direito de recorrer à Justiça). Apesar de a situação relatada pelo partido ter ocorrido nos logs de ambos os turnos, o partido pediu a invalidação apenas de votos do segundo turno.

O nome do sócio da Gaio.io também aparece nos anexos da ação do PL. Em algumas das capturas de telas incluídas como provas técnicas aparece a mensagem: "Você está visualizando a tela de Eder Balbino".

Um dos arquivos que constavam na pasta de Cerimedo tinha como proprietário Angelo Denicoli, que é assessor da Presidência da Petrobras desde 2021 e que, durante a gestão de Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde, ocupou o cargo de diretor do departamento de monitoramento e avaliação do SUS. Na época, ele fez postagens em favor do chamado "tratamento precoce", defendido por Bolsonaro.

Na Petrobras, Denicoli atuaria com outros dois militares como uma espécie de informante de Bolsonaro e teria sido indicado pelo presidente para o cargo, conforme informou a coluna de Malu Gaspar, no jornal O Globo, em maio.

Na agenda do assessor-chefe do gabinete da Presidência da República, João Henrique Nascimento de Freitas, consta reunião com Denicoli em fevereiro deste ano.

Cerimedo disse que não conhecia as pessoas citadas, mas que iria investigar e falar com sua equipe. "Minha resposta é que não os conheço, não fizeram minha pesquisa e não aparecem em meus arquivos. Você está exibindo arquivos de cópia."

Após o contato da reportagem, a pasta do drive, que até então estava liberada, aparecia como indisponível, sendo preciso solicitar acesso para abri-la.

Apesar de o arquivo de Denicoli, de fato, ter o mesmo nome de outro arquivo de Cerimedo junto ao termo "Cópia de", a data da última modificação indica que ela já tinha sido feita ao menos em 17 de novembro. Mesma data em que Eder Balbino editou dois dos arquivos de propriedade de Cerimedo.

Como mostrou a reportagem, parte dos elementos que tinham sido trazidos por Cerimedo nas redes sociais apareceram posteriormente no relatório do PL apresentado ao TSE.

Em 14 de novembro, por exemplo, Cerimedo afirmou que havia diferença entre os logs das urnas antigas e as urnas novas. O vídeo dizia que "logs falsos foram encontrados nas urnas anteriores a 2020" e que, por outro lado, "nas urnas de 2020 não foram observados os logs piratas". Falava ainda em um "código pirata".

O log da urna é uma espécie de "diário de bordo" de tudo que aconteceu nela, enquanto o código é o programa que dá os comandos para ela funcionar.

Na semana seguinte, no dia 22, o PL protocolou representação junto ao TSE. Uma diferença entre os logs gerados pelas urnas mais novas -o modelo 2020- e os demais modelos foi justamente o argumento utilizado pelo partido de Bolsonaro.

Em novembro, em entrevista por telefone à Folha de S.Paulo, Cerimedo disse que "queria entender o comportamento eleitoral" e que, então, contratou uma empresa privada pequena para fazer uma auditoria. Questionado sobre o nome da empresa que teria contratado, disse que não podia informar. "Não posso revelar o nome porque não foi um contrato, foi um favor. São amigos." Segundo ele, seriam poucos rapazes que lidam com ciência de dados.

O CNPJ da Gaio.io é registrado em Uberlândia. De acordo com declaração do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, em coletiva à imprensa em 23 de novembro, o problema levantado pelo partido na representação foi descoberto por um "gênio de Uberlândia".

"Nós contratamos uma empresa de homens altamente qualificados para poder acompanhar as eleições, e eles, por coincidência e talvez por tecnologia, conseguiram atingir esse objetivo de conseguir algo palpável no segundo turno", disse Valdemar, um dia depois de ter apresentado ação ao TSE.

"No segundo turno eles aumentaram a equipe, trouxeram um gênio lá de Uberlândia e que ajudou muito a gente. Aí ele descobriu esse problema que o nosso pessoal não tinha descoberto. Então nós fomos obrigados a colocar isso aí."

Diferentemente do apontado no relatório do PL, a limitação relatada não impede a identificação e a fiscalização delas, conforme apontam especialistas em computação.

Dono do canal "La Derecha Diário" e conhecido da família Bolsonaro, o argentino tornou-se praticamente um herói para os bolsonaristas insatisfeitos com a derrota, atuando diariamente a favor das manifestações. 

 

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