Entre as consequências da pandemia de covid-19, estão os efeitos negativos na disposição física e mental de pessoas que atuam no atendimento de pacientes infectados com a doença nos hospitais. E na segunda matéria da reportagem especial sobre o setembro amarelo, realizada pelo Jornal Folha do Estado, o assunto é a saúde mental dos profissionais de saúde que estão na linha de frente da pandemia.

Os profissionais da enfermagem formam o grupo mais frágil entre as pessoas que trabalham diretamente com os pacientes contaminados pela covid, e de acordo com Viviane Camargo, integrante do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), o adoecimento de muitos enfermeiros e auxiliares agravou velhos problemas enfrentados pela categoria, a sobrecarga de trabalho é apenas um deles. "Com a pandemia, tudo piorou. Como muitos enfermeiros e auxiliares adoeceram com a covid-19, a sobrecarga de trabalho aumentou", destaca Viviane. A enfermeira feirense Tânia da Costa é um dos exemplos deste caso.

"De uma hora para outra, a gente teve que dobrar os turnos, não tínhamos descanso, e voltar para casa se tornou perigoso, quando a pandemia se agravou, passamos a ver muitas mortes, e tudo isso acabou desestimulando a gente, tiveram horas em que o cansaço era a única coisa em que pensávamos, mas abandonar o posto não era uma opção e seguimos enfrentando a carga", confessou Tânia.

A profissional foi diagnosticada em dezembro do ano passado com Transtorno de ansiedade social, também conhecido como fobia social, que corresponde à dificuldade apresentada pela pessoa em interagir socialmente. A ansiedade social pode ser bastante incapacitante e interferir no desempenho profissional e relacionadas ao contato social, o que pode levar ao desenvolvimento de outros transtornos psicológicos, como depressão grave. "Após o diagnóstico, eu fui afastada do trabalho para me cuidar. De acordo com o psicólogo e psiquiatra que me acompanharam, eu tinha desenvolvido a doença por conta da pressão que estava vivendo no hospital, eu já tinha alguns traços, mas nunca tinha percebido, e eles foram agravados. Fui cuidar da minha saúde mental e passei a valorizá-la como eu recomendava que meus pacientes cuidassem da sua saúde física", disse a enfermeira.

Uma pesquisa da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP aponta que 36% dos 916 profissionais da área da saúde, que atuam na linha de frente e foram acompanhados pelos cientistas, possuem pelo menos um indicador de problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão, insônia e estresse pós-traumático. Os profissionais envolvidos na pesquisa são de todas as regiões do País e responderam questões num formulário on-line. O resultado revela ainda que 61% dos entrevistados possuem indicadores de insônia, 43% de ansiedade, 40% de depressão e 36% de estresse pós-traumático.

Em Feira de Santana, o Hospital Inácia Pinto dos Santos, o Hospital da Mulher passou a oferecer consultas de psicologia para os funcionários, o serviço surgiu com o objetivo de proporcionar acolhimento àqueles que se sentem sobrecarregados devido à pandemia. As consultas integram o programa Qualidade de Vida e Bem-Estar do Servidor. O serviço é realizado no ambulatório de especialidades às terças e quintas, de 13 às 17 horas.

"Esse projeto surgiu da necessidade dos funcionários e colaboradores diante das queixas da sobrecarga emocional e do nível de estresse durante esse tempo de pandemia da covid-19", afirmou a diretora presidente da Fundação Hospitalar, Gilberte Lucas. Para participar dos atendimentos com o psicólogo, os interessados devem comprovar o vínculo empregatício na unidade e fazer o agendamento no setor de marcação do ambulatório.